joão nasceu no inverno, achando que era eterno, pendurado no peito materno.
nasceu João serelepe, esperto feito uma lebre, naquele humilde casebre.
filho de benzedeira, pegado pela parteira, em plena sexta-feira.
vagiu feito uma fera, mamou feito um leão, dormiu e acordou na primavera.
cresceu João taludo, brincou João de tudo, bola de gude papagaio pião.
cresceu mais um pouquinho, sua alcunha era negrinho, foi ficando safadinho.
tornou-se João adolescente, mas sem um emprego decente, achava que não era gente.
fumava maconha nas esquinas, erguia as saias das meninas, furtava frutas nas cantinas.
quando João fez dezoito, armou-se com um 38, tornou-se o valentão da rua oito.
mas João virou homem, e forte feito um lobisomem, empregou-se no Clube Hom's.
lá conheceu Carmelita, coroa podre de rica, assim mudou João de vida.
tinha comida na mesa, administrava uma empresa, adotou a negrinha Tereza.
não se achava mais eterno, guiando seu Volkswagen, dentro do seu fino terno...
e parece que eu não tinha mesmo que fazer esta madrugada.
Janeiro- 2015