esse esgar seco é de negro?
esse chorar sem lágrimas
esse fedor de sangue coagulado nos logradouros
existe um cais de porto
onde jaz milhões de almas pretas
expulsas de seus corpos pálidos
corpos quase brancos
onde jaz esgotadas
as últimas gotas de sangue
existe um cais de porto
onde atrocidades bárbaras tisnaram
a tez do dia que seria azul
mas que hora é negra
este cais de porto despresível
onde avaliavam-se homens por suas arcadas
onde mãos vis estiravam bocas
para precificar a carga chegada de mar além
cais de porto imundo
onde porcos chafurdavam
restos de merda ainda nos corpos
estirados na lama podre da morte
existe um cais de porto
uma história que se deu há pouco
história esquecida por historiadores
ignoradas por livros e acadêmicos
mas cobrada pelos poetas desse povo
capturado trazido torturado
chacinado
cais de porto olhando o mar
no coração desta terra castigada
existe nesse solo marcado por obscuro pretérito
um cais de porto de nome Valongo
cais de porto atravessado
pela lança cruel da atrocidade humana
cais de porto de nome Valongo
Dez- 2024
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