quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

O crime do negro

era negro retinto, forte e desimportante
embrutecido pelo eito excessivo no sol a pino
como quase totalidade dos negros da província
cruzava o beco no meio do dia
sinhazinha sapeca em sentido oposto deu de correr
e gritar: tarado tarado tarado
entorpecido foi capturado, linchado e amarrado ao tronco
o couro da chibata cortou-lhe a carne
lanhou-lhe a alma irreversivelmente
ele que era homem mas que a turba enfurecida
gritava-lhe: animal animal animal
na noite anterior o senhor deste mesmo negro
homem de engenho e proprietário de terras
tirava aos tapas da senzala uma negrinha muito jovem
banhou-a no pátio à água fria do poço
estuprando-a ali mesmo sob a luz das estrelas
observado pelas janelas perplexas da casa grande
do pobre negro restou o cadáver 
sob o céu de um azul limpo
no pelourinho silencioso e ensanguentado
a multidão dispersa e apascentada pelas ruas
calmas da "próspera" província
seguiu a vida ordinária e despreocupada
de cidadãos honestos e justos.

                                Dez- 2024

Nenhum comentário:

Postar um comentário