domingo, 5 de janeiro de 2025

Uma vírgula

pra negro retinto 
estava por uma vírgula
o destino cobraria o preço caro
até os 15 tinha tudo
e tudo era nada
queria amor, carinho e tudo o mais

vintém não tinha, um esfregão
sua universidade
e as paralelas do barro
subúrbio, marmita, remela 
e trem lotado, e ainda queria amar

era cego posto não queria ver
sonhava pernas, duros peitos, buceta
a mais linda sonhava
pra retinto faltava uma vírgula

por fim achou quem amasse
quem alto sonhava pro seu parco defunto
envesgaram-te os olhos
onde passava era um canto de olho
um escárnio

depois de pancada, polícia
e escarros na cara andou percebendo
a mais linda não tem parecença
sua pele é pra outros voos, não este quase retinto

que a bala persegue
e muitas vezes encontra já com cicatrizes
andou percebendo que ascender
nesta sociedade é restrito
à aparência mais "amena", outro tom

a mais linda formou-se
e já tinha um bem, um ouro, um euro
e ele afro
fruto fraco pro jogo franco daquelas regras 
quedou-se inconformado

veio-lhe a prata tempora
os sonhos todos vencidos, pisados
nuvem nos olhos
calos nas mãos de tanto estudo
já não esperava mais da vida
eis tudo

                               Dez- 2023

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