meu riso branco não me torna branco
ainda que cubra de resignação
a fonte de avessos em que me afogo
minha alma lavada de potente alvejante
determina a paz enganosa
sob as intenções de que me esgoto
e de onde obtenho medos e angústias
meu riso branco não me torna branco
ainda que o hidrogênio da bomba
de injúrias esqueça dor na minha voz
que minha dicção maltrate minha alma negra
ainda exibo meu tanto de espanto
na face desdenhada do mau destino
não aceito o cartão com flores
daqueles que derramaram
apenas o ódio da sua peçonha
sobre o riso franco de uma criança boba
meu riso branco não me torna branco
é apenas a face oposta
da minha usurpada felicidade.
Agost- 2020
Poemas de temática social onde aborda, em linguagem simples, de maneira aberta e franca a fome, a miséria, as desigualdades e os privilégios da elite brasileira, e, voltados para a condição do negro e afro-descendente no Brasil fazem menção a fatos históricos desde o continente de origem (África) aos dias atuais, ao amor, à paixão e ao desejo.
terça-feira, 4 de agosto de 2020
quinta-feira, 9 de julho de 2020
O estigma do ferro
eu sou escravo
escravo subordinado às leis
do império da cor,
humilhado com o estigma do ferro.
não trago correntes nos pulsos
nos tornozelos, no pescoço.
sofisticaram os métodos e as correntes são outras.
escravo negro renegado
escravo de uma cultura de mentiras
escravo de padrões estabelecidos.
eu sou escravo
escravo de pareceres
contrários à minha imagem,
erigidos em terrenos arenosos
cujo objetivo é degenerar reputações.
escravo das tarifas
impostas à minha pele negra
das demandas rechaçadas
da liberdade abolida do meu arbítrio.
e me afogo na lama
da sofisticada trama psicopata.
alguns irmãos gozam da liberdade
e respiram bons ares,
muitos sucumbiram
aos atrozes crimes às suas peles.
eu sigo trancado
sob estas grades de engodos,
refém do extermínio da minha teima,
do preço alto pela audácia da negritude.
escravo da ditadura do perverso.
Jul- 2020
escravo subordinado às leis
do império da cor,
humilhado com o estigma do ferro.
não trago correntes nos pulsos
nos tornozelos, no pescoço.
sofisticaram os métodos e as correntes são outras.
escravo negro renegado
escravo de uma cultura de mentiras
escravo de padrões estabelecidos.
eu sou escravo
escravo de pareceres
contrários à minha imagem,
erigidos em terrenos arenosos
cujo objetivo é degenerar reputações.
escravo das tarifas
impostas à minha pele negra
das demandas rechaçadas
da liberdade abolida do meu arbítrio.
e me afogo na lama
da sofisticada trama psicopata.
alguns irmãos gozam da liberdade
e respiram bons ares,
muitos sucumbiram
aos atrozes crimes às suas peles.
eu sigo trancado
sob estas grades de engodos,
refém do extermínio da minha teima,
do preço alto pela audácia da negritude.
escravo da ditadura do perverso.
Jul- 2020
domingo, 21 de junho de 2020
Esquecimento
vó é sagrada
a minha sofreu de esquecimento induzido
domesticada
a homicídios, seduções
violência brava
dissolveu o miolo exposto às intemperes
a dignidade esgotada
vivia como escrava analfabeta
na favela/senzala
palmilhando o chão das lavouras da vida
encarcerada, presa (fácil),
aglomerada
no eito
da busca por alimento de fim de feira
eles contam
esquecimento
em aplicações financeiras
e covardes
atos mascarados
mãe é ofício santo
a minha trouxe as sequelas no intelecto
na aparência
no pranto
os tempos difíceis no silêncio
no esquecimento
também
na desilusão, no desencanto
o peso da batalha
nos olhos
fundos
na sobrecarga sobre os ombros
as poucas posses
pelos cantos
e de conquista
o mal desenhar do nome
herança
das minhas fundas raízes
de desespero
e sangrando
lágrimas condensadas
que não saem
dos
olhos
fui bebendo gotas de espanto
escapando
de balas de preconceito
agressões de farda
negro
num mundo branco
rezando a cartilha do senhor de engenho
fazendo fortunas alheias
recebendo migalhas
dos desmamados dos peitos ancestrais
cujos atos
seguem sequelando pranto
aparência
intelecto
induzindo esquecimento
domesticando
pelo
menos
por enquanto
pelo
menos
por enquanto
Jun- 2020
quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019
Minha Mãe
Minha mãe que suportava tudo
ralava a barriga no tanque
Foi educada assim
pra sem contestar sempre servir
Negra de cama, mesa e fogão
gastou a vida limpando chão
Foi educada assim
pra sem contestar sempre servir
Sem contar que trabalhava fora
faxinando faxinando faxinando
noite adentro, madrugada afora
Gastou a vida lavando louça
gastou a vida limpando chão
para o patrão e sua prole branca sujarem
Foi educada assim
pra sem contestar sempre servir
Fevereiro- 2019
ralava a barriga no tanque
Foi educada assim
pra sem contestar sempre servir
Negra de cama, mesa e fogão
gastou a vida limpando chão
Foi educada assim
pra sem contestar sempre servir
Sem contar que trabalhava fora
faxinando faxinando faxinando
noite adentro, madrugada afora
Gastou a vida lavando louça
gastou a vida limpando chão
para o patrão e sua prole branca sujarem
Foi educada assim
pra sem contestar sempre servir
Fevereiro- 2019
segunda-feira, 3 de julho de 2017
Usurpadores
aportarão no cais os usurpadores,
mesmo já não existindo cais,
mesmo estando o cais a léguas de distância,
mesmo estando saturado este chão.
usurparão desta terra
já tão usurpada da sua dignidade.
são estreitas as margens e há lixo
nas águas onde aportam
as vicissitudes de um povo.
um menino negro e cativo
desde o ventre materno transpõe
a ponte que existe no lugar do cais.
vai em busca do conhecimento,
na escola dos usurpadores,
usurpado que está da sua etnia,
da sua cor, da história do seu povo.
e tem forjado silenciosamente dentro de si,
o cepo, a chibata e o pelourinho.
e é privado de liberdade que se vive
além do cais do porto onde aportou
um povo e sua cultura que forjou uma nação.
e usurparão ainda o filho
do filho do filho até a última geração
que pisará neste solo, da história de cada um.
Julho- 2017
mesmo já não existindo cais,
mesmo estando o cais a léguas de distância,
mesmo estando saturado este chão.
usurparão desta terra
já tão usurpada da sua dignidade.
são estreitas as margens e há lixo
nas águas onde aportam
as vicissitudes de um povo.
um menino negro e cativo
desde o ventre materno transpõe
a ponte que existe no lugar do cais.
vai em busca do conhecimento,
na escola dos usurpadores,
usurpado que está da sua etnia,
da sua cor, da história do seu povo.
e tem forjado silenciosamente dentro de si,
o cepo, a chibata e o pelourinho.
e é privado de liberdade que se vive
além do cais do porto onde aportou
um povo e sua cultura que forjou uma nação.
e usurparão ainda o filho
do filho do filho até a última geração
que pisará neste solo, da história de cada um.
Julho- 2017
quarta-feira, 10 de maio de 2017
O menino negro
o menino negro olhava, olhava e não se via.
bebê, pensou ser a retina que olhava, olhava e não se via.
criança, desconfiou mas não pensou nada.
foi à escola, conheceu as letras, formou as palavras,
mas ainda não se via. jovem, pensou então
que o problema fosse ele, que estava nele, mas calou.
trabalhou cedo, leu livros, fez biblioteca, enamorou-se,
adquiriu conhecimento, mas ainda olhava e não se via.
mas agora o menino negro era já homem feito,
começou a perceber que o problema não estava nele,
que não era ele, chocou-se; mas desta vez não calou,
protestou! protestou! protestou!
mas agora, o menino negro que era já homem feito,
de tanto protestar começou a ouvir,
desta vez dos outros, que o problema estava nele,
que era ele o problema.
então o menino negro que era já homem feito,
conheceu de perto a hipocrisia, a injustiça,
mas não se abateu, não parou de protestar, protestar.
o menino negro, já pai e avô, partiu sem ver sua luta vencida:
o mundo diverso, em igualdade, livre do preconceito e do racismo.
Maio- 2017
bebê, pensou ser a retina que olhava, olhava e não se via.
criança, desconfiou mas não pensou nada.
foi à escola, conheceu as letras, formou as palavras,
mas ainda não se via. jovem, pensou então
que o problema fosse ele, que estava nele, mas calou.
trabalhou cedo, leu livros, fez biblioteca, enamorou-se,
adquiriu conhecimento, mas ainda olhava e não se via.
mas agora o menino negro era já homem feito,
começou a perceber que o problema não estava nele,
que não era ele, chocou-se; mas desta vez não calou,
protestou! protestou! protestou!
mas agora, o menino negro que era já homem feito,
de tanto protestar começou a ouvir,
desta vez dos outros, que o problema estava nele,
que era ele o problema.
então o menino negro que era já homem feito,
conheceu de perto a hipocrisia, a injustiça,
mas não se abateu, não parou de protestar, protestar.
o menino negro, já pai e avô, partiu sem ver sua luta vencida:
o mundo diverso, em igualdade, livre do preconceito e do racismo.
Maio- 2017
segunda-feira, 1 de maio de 2017
Filha de Olorum
à Júlia e Juliana Costa
mulher de brio e força,
negra de beleza
e graça que habitas
o chão das Minas Gerais
do meu Brasil
mais forte na potência
do ouro e do diamante.
filha obediente de Olorum,
criador onipotente
do que existe,
protetor dos povos
oprimidos das Nações.
que todos os orixás
protejam-na na adversidade,
que Oxum traga-te paz
de espírito
e prosperidade,
e Ogum
fortaleça-te na guerra
assim como inspire
estes meus humildes versos.
mulher de negritude
convicta,
que é pássaro
na dor de transpor
distâncias.
conhecedora
arguta das demandas
do teu povo,
a tua etnia é também
a minha etnia.
amar-te é um desafio,
é a força da luta
assídua pela conquista,
é a minha audácia
mais intrépida,
minha certeza lúcida.
apaixona-me
tua beleza a cada visão
da tua imagem,
mas ganha-me na íntegra
teu intelecto
a cada sílaba inteligente
que sutil pronuncias.
negra que não és minha,
pois livre
és como o vento,
tu que foste
concebida
desde o ventre d'África,
mãe generosa
das Nações do Mundo:
tua pele tem
a delicadeza das pétalas
do alto da estatura
da flor na primavera.
os teus olhos
a diversidade do topázio
com esmero
lapidado pelo ourives.
tua voz o timbre
doce das estrelas
quando cantam galáxias.
a sensualidade
crespa dos teus cabelos,
sob o domínio
do turbante, que é antes
o traço forte
de reafirmação da tua
identidade,
tem o brilho íntegro
de tudo que é forte,
de tudo que encanta.
o sorriso entre
teus lábios,
que tem a textura do figo,
tem a alvura
do marfim espoliado
desde as savanas
da terra mãe das Nações.
tua geografia tem
a complexidade
dos contornos
do Velho Continente,
sob o linho do vestido
que oculta
tua íntima beleza.
tua arquitetura
a simetria das pétalas
de uma orquídea
que esbanja graça,
fincada na autenticidade
da natureza
mais selvagem.
sejas ostensiva na poesia,
o berço autêntico
de tudo que é belo.
pões a nódoa
do teu pranto
nos dias de fragilidade
sobre os originais
dos poemas que escrevo,
que mais perto
e dentro
deste poeta,
que hoje te canta,
não podes estar na vida.
tu que no poder da tua
natureza de mulher
tens a força guerreira
de uma Luísa Mahin,
de uma Dandara,
de uma Maria Felipa,
de uma Carolina de Jesus.
corre nas tuas artérias
o sangue ancestral
dos povos guerreiros d'África.
desde o Nilo próspero
às minas
do diamante espoliado
das mãos negras do teu povo.
desde o plantio
do milho e do arroz
forjado
pelo sangue do teu povo
às lavouras do café,
da batata e da mandioca,
sob o manto sagrado
dos dialetos que compõem
os idiomas do Continente.
Maio- 2017
mulher de brio e força,
negra de beleza
e graça que habitas
o chão das Minas Gerais
do meu Brasil
mais forte na potência
do ouro e do diamante.
filha obediente de Olorum,
criador onipotente
do que existe,
protetor dos povos
oprimidos das Nações.
que todos os orixás
protejam-na na adversidade,
que Oxum traga-te paz
de espírito
e prosperidade,
e Ogum
fortaleça-te na guerra
assim como inspire
estes meus humildes versos.
mulher de negritude
convicta,
que é pássaro
na dor de transpor
distâncias.
conhecedora
arguta das demandas
do teu povo,
a tua etnia é também
a minha etnia.
amar-te é um desafio,
é a força da luta
assídua pela conquista,
é a minha audácia
mais intrépida,
minha certeza lúcida.
apaixona-me
tua beleza a cada visão
da tua imagem,
mas ganha-me na íntegra
teu intelecto
a cada sílaba inteligente
que sutil pronuncias.
negra que não és minha,
pois livre
és como o vento,
tu que foste
concebida
desde o ventre d'África,
mãe generosa
das Nações do Mundo:
tua pele tem
a delicadeza das pétalas
do alto da estatura
da flor na primavera.
os teus olhos
a diversidade do topázio
com esmero
lapidado pelo ourives.
tua voz o timbre
doce das estrelas
quando cantam galáxias.
a sensualidade
crespa dos teus cabelos,
sob o domínio
do turbante, que é antes
o traço forte
de reafirmação da tua
identidade,
tem o brilho íntegro
de tudo que é forte,
de tudo que encanta.
o sorriso entre
teus lábios,
que tem a textura do figo,
tem a alvura
do marfim espoliado
desde as savanas
da terra mãe das Nações.
tua geografia tem
a complexidade
dos contornos
do Velho Continente,
sob o linho do vestido
que oculta
tua íntima beleza.
tua arquitetura
a simetria das pétalas
de uma orquídea
que esbanja graça,
fincada na autenticidade
da natureza
mais selvagem.
sejas ostensiva na poesia,
o berço autêntico
de tudo que é belo.
pões a nódoa
do teu pranto
nos dias de fragilidade
sobre os originais
dos poemas que escrevo,
que mais perto
e dentro
deste poeta,
que hoje te canta,
não podes estar na vida.
tu que no poder da tua
natureza de mulher
tens a força guerreira
de uma Luísa Mahin,
de uma Dandara,
de uma Maria Felipa,
de uma Carolina de Jesus.
corre nas tuas artérias
o sangue ancestral
dos povos guerreiros d'África.
desde o Nilo próspero
às minas
do diamante espoliado
das mãos negras do teu povo.
desde o plantio
do milho e do arroz
forjado
pelo sangue do teu povo
às lavouras do café,
da batata e da mandioca,
sob o manto sagrado
dos dialetos que compõem
os idiomas do Continente.
Maio- 2017
quarta-feira, 21 de dezembro de 2016
Tambores d'África
e soam os tambores do candomblé,
tambores que vêm d'Africa,
tambores dos terreiros da Bahia,
dos filhos negros, filhos de Oxóssi,
senhor das florestas, misericordioso orixá.
soa tambor, liberta teus filhos do carcere!
soa tambor, faz cessar a chibata
que canta nas costas do teu filho negro!
soa tambor, propaga a paz
que o culto do teu povo é pela liberdade!
muitos dos filhos d'Africa, filhos de Olorun,
sofreram em navios negreiros
até aportar, os mais fortes, na costa brasileira.
muitos pereceram diante da barbárie,
e seus corpos, lançados ao mar,
foram devorados por tubarões.
os que aqui aportaram,
conheceram o inferno na terra:
subjugados, encarcerados, torturados
muitos pereceram mais uma vez, e tantas outras.
os tambores, hoje, ainda que tímidos,
soam com maior liberdade nos terreiros
de candomblé, nos guetos, no silêncio das noites.
a genuína pátria do seu filho negro,
África mãe, tem as cores da liberdade,
embora haja tanta prisão
para os filhos da sua terra,
embora haja tanta fome, tanta dor e tanta guerra.
os seus filhos que aqui morreram lutando,
são lembrados nos toques dos tambores d'Africa.
os que resistiram às injúrias e injustiças,
ainda batalham com seus tambores, sua inteligência,
sua força e toda a sua fé
na luta pela liberdade e pela igualdade.
soa tambores do candomblé!
soa tambores d'Africa!
soa tambores dos terreiros da Bahia!
pela liberdade ao culto! pela liberdade de um povo!
Dez- 2016
tambores que vêm d'Africa,
tambores dos terreiros da Bahia,
dos filhos negros, filhos de Oxóssi,
senhor das florestas, misericordioso orixá.
soa tambor, liberta teus filhos do carcere!
soa tambor, faz cessar a chibata
que canta nas costas do teu filho negro!
soa tambor, propaga a paz
que o culto do teu povo é pela liberdade!
muitos dos filhos d'Africa, filhos de Olorun,
sofreram em navios negreiros
até aportar, os mais fortes, na costa brasileira.
muitos pereceram diante da barbárie,
e seus corpos, lançados ao mar,
foram devorados por tubarões.
os que aqui aportaram,
conheceram o inferno na terra:
subjugados, encarcerados, torturados
muitos pereceram mais uma vez, e tantas outras.
os tambores, hoje, ainda que tímidos,
soam com maior liberdade nos terreiros
de candomblé, nos guetos, no silêncio das noites.
a genuína pátria do seu filho negro,
África mãe, tem as cores da liberdade,
embora haja tanta prisão
para os filhos da sua terra,
embora haja tanta fome, tanta dor e tanta guerra.
os seus filhos que aqui morreram lutando,
são lembrados nos toques dos tambores d'Africa.
os que resistiram às injúrias e injustiças,
ainda batalham com seus tambores, sua inteligência,
sua força e toda a sua fé
na luta pela liberdade e pela igualdade.
soa tambores do candomblé!
soa tambores d'Africa!
soa tambores dos terreiros da Bahia!
pela liberdade ao culto! pela liberdade de um povo!
Dez- 2016
segunda-feira, 12 de janeiro de 2015
João valentão
joão nasceu no inverno, achando que era eterno, pendurado no peito materno.
nasceu João serelepe, esperto feito uma lebre, naquele humilde casebre.
filho de benzedeira, pegado pela parteira, em plena sexta-feira.
vagiu feito uma fera, mamou feito um leão, dormiu e acordou na primavera.
cresceu João taludo, brincou João de tudo, bola de gude papagaio pião.
cresceu mais um pouquinho, sua alcunha era negrinho, foi ficando safadinho.
tornou-se João adolescente, mas sem um emprego decente, achava que não era gente.
fumava maconha nas esquinas, erguia as saias das meninas, furtava frutas nas cantinas.
quando João fez dezoito, armou-se com um 38, tornou-se o valentão da rua oito.
mas João virou homem, e forte feito um lobisomem, empregou-se no Clube Hom's.
lá conheceu Carmelita, coroa podre de rica, assim mudou João de vida.
tinha comida na mesa, administrava uma empresa, adotou a negrinha Tereza.
não se achava mais eterno, guiando seu Volkswagen, dentro do seu fino terno...
e parece que eu não tinha mesmo que fazer esta madrugada.
Janeiro- 2015
nasceu João serelepe, esperto feito uma lebre, naquele humilde casebre.
filho de benzedeira, pegado pela parteira, em plena sexta-feira.
vagiu feito uma fera, mamou feito um leão, dormiu e acordou na primavera.
cresceu João taludo, brincou João de tudo, bola de gude papagaio pião.
cresceu mais um pouquinho, sua alcunha era negrinho, foi ficando safadinho.
tornou-se João adolescente, mas sem um emprego decente, achava que não era gente.
fumava maconha nas esquinas, erguia as saias das meninas, furtava frutas nas cantinas.
quando João fez dezoito, armou-se com um 38, tornou-se o valentão da rua oito.
mas João virou homem, e forte feito um lobisomem, empregou-se no Clube Hom's.
lá conheceu Carmelita, coroa podre de rica, assim mudou João de vida.
tinha comida na mesa, administrava uma empresa, adotou a negrinha Tereza.
não se achava mais eterno, guiando seu Volkswagen, dentro do seu fino terno...
e parece que eu não tinha mesmo que fazer esta madrugada.
Janeiro- 2015
segunda-feira, 25 de novembro de 2013
Espectros
Poema sobre o trabalho infantil
e de homens nas carvoarias
imensos fornos pejados
de hulha em brasa,
medonho inferno dantesco
em tonalidade rubra,
construídos de sangue
a esvair-se pela pele:
esbórnia estúpida da vil
ganância aristocrática.
fagulhas incandescentes
borrando tragicamente
o céu azul.
uma fumaça escura
turvando a visão,
penetrando o pulmão
da infância perdida
num trabalho ilegal e degradante.
e são crianças, ainda,
adoentadas,
enfraquecidas e ignorantes.
e são homens a passo largo
à sepultura precoce.
e são velhos tísicos,
sem amanhã,
à beira da morte iminente.
pele negra, trabalho escravo,
ancestralidade...
mãos calejadas de tanto
sofrer descaso.
sonho tolhido
sob sol lancinante.
identidade há muito perdida
nas voltas da vida.
pés pisando nuvens
a roda do capital
no seu ciclo macabro.
pastel de quimera,
quimera no prato:
estômago colado
às costas e a epiderme
a desenhar em traço
trágico a ossatura.
injuriada infância
irmã de todos nós.
homem de lama de ainda
nem aurora ao crepúsculo.
cachorro baio de pele e osso
em moscas e escaras,
no cercado da propriedade
sem cercado de dono alheio.
rota e frágil estrutura
de madeira
esparsa coberta
com folhas escassas
de zinco furado: seu lar.
(uma industria suja, excelência,
que fabrica seu confortável automóvel,
que calça seus pés com seus tênis
da moda, seus sapatos finos,
patrocina seu terno de linho nobre,
sua cobertura milionária,
sua viagem de avião.
uma indústria suja, excelência,
que patrocina seu bom domingo,
das melhores cervejas, uísques,
do churrasco com as melhores carnes,
seu restaurante, seu alimento sofisticado,
a joia rara no pescoço da sua mulher).
Nov. 2013
.
e de homens nas carvoarias
imensos fornos pejados
de hulha em brasa,
medonho inferno dantesco
em tonalidade rubra,
construídos de sangue
a esvair-se pela pele:
esbórnia estúpida da vil
ganância aristocrática.
fagulhas incandescentes
borrando tragicamente
o céu azul.
uma fumaça escura
turvando a visão,
penetrando o pulmão
da infância perdida
num trabalho ilegal e degradante.
e são crianças, ainda,
adoentadas,
enfraquecidas e ignorantes.
e são homens a passo largo
à sepultura precoce.
e são velhos tísicos,
sem amanhã,
à beira da morte iminente.
pele negra, trabalho escravo,
ancestralidade...
mãos calejadas de tanto
sofrer descaso.
sonho tolhido
sob sol lancinante.
identidade há muito perdida
nas voltas da vida.
pés pisando nuvens
a roda do capital
no seu ciclo macabro.
pastel de quimera,
quimera no prato:
estômago colado
às costas e a epiderme
a desenhar em traço
trágico a ossatura.
injuriada infância
irmã de todos nós.
homem de lama de ainda
nem aurora ao crepúsculo.
cachorro baio de pele e osso
em moscas e escaras,
no cercado da propriedade
sem cercado de dono alheio.
rota e frágil estrutura
de madeira
esparsa coberta
com folhas escassas
de zinco furado: seu lar.
(uma industria suja, excelência,
que fabrica seu confortável automóvel,
que calça seus pés com seus tênis
da moda, seus sapatos finos,
patrocina seu terno de linho nobre,
sua cobertura milionária,
sua viagem de avião.
uma indústria suja, excelência,
que patrocina seu bom domingo,
das melhores cervejas, uísques,
do churrasco com as melhores carnes,
seu restaurante, seu alimento sofisticado,
a joia rara no pescoço da sua mulher).
Nov. 2013
.
HaiCais
pulou do tanque
a rã de Bashô,
que será que ele acho(u)?
o sal do oceano,
será, meu Deus,
a lágrima do peixe?
eu olho a formiga
ela nem liga
passa e se equilibra
se espicha toda
a lagartixa
e come a barata viva
o que te importa
é a cor da epiderme? saibas,
será banquete de verme!
digo em verdade
brincar a síntese do verso
é a maior liberdade
reúno num haicai
minha África ancestral
e a cultura oriental
é de admirar
seu jeito torto de amar
ama amar sem amar
parado passo
andando me desfaço
e sigo passando
belo o boi no pasto,
mas belo? o que importa
é o boi no prato!
haicai suburbano:
pega o ônibus, vai de trem,
vive meio engano.
digo com apreço,
dinheiro? na sepultura
tudo é esqueleto!
castiga a fome
devora o ventre da criança
que há dias não come
abjeto salário,
por que não tenta o patrão
viver como operário?
brinca o vento
de desmaiar em teus braços,
corpo em movimento.
estou carente de amar
mas só tenho esta cama vazia
e a mania de pensar
quanto lamento
de dor... profundo canto
do sapo cururu
conta-me sabiá,
onde fica sua morada.
no pé de jacarandá?
DÚVIDA
sr. Peixe, pergunto:
no fundo do mar, como
dormes sem deitar?
A GALINHA
no manso murmúrio
do rio, a galinha, rente
à margem, dormiu.
INVERNO
bicho de pelúcia,
no denso frio da invernada:
criança agasalhada.
PRIMAVERA
brota a primavera,
num bem devagarinho...
-gorjeia passarinho!
ÀQUELE AMOR
hoje relembro com
ardor, toda a inocência
dos bilhetes de amor.
MANHÃ
vendaval imenso,
que revirou, imenso drama:
mexeu toda a cama!
DEPOIS DA CHUVA
passa a lua
no asfalto sob meus pés,
caminho por estas ruas.
FLORES DE ABRIL
finda as flores de abril,
pelas brandas mãos do outono.
-mais uma folha caiu!
2011- 2012- 2013- 2018- 2019
.
a rã de Bashô,
que será que ele acho(u)?
o sal do oceano,
será, meu Deus,
a lágrima do peixe?
eu olho a formiga
ela nem liga
passa e se equilibra
se espicha toda
a lagartixa
e come a barata viva
o que te importa
é a cor da epiderme? saibas,
será banquete de verme!
digo em verdade
brincar a síntese do verso
é a maior liberdade
reúno num haicai
minha África ancestral
e a cultura oriental
é de admirar
seu jeito torto de amar
ama amar sem amar
parado passo
andando me desfaço
e sigo passando
belo o boi no pasto,
mas belo? o que importa
é o boi no prato!
haicai suburbano:
pega o ônibus, vai de trem,
vive meio engano.
digo com apreço,
dinheiro? na sepultura
tudo é esqueleto!
castiga a fome
devora o ventre da criança
que há dias não come
abjeto salário,
por que não tenta o patrão
viver como operário?
brinca o vento
de desmaiar em teus braços,
corpo em movimento.
estou carente de amar
mas só tenho esta cama vazia
e a mania de pensar
quanto lamento
de dor... profundo canto
do sapo cururu
conta-me sabiá,
onde fica sua morada.
no pé de jacarandá?
DÚVIDA
sr. Peixe, pergunto:
no fundo do mar, como
dormes sem deitar?
A GALINHA
no manso murmúrio
do rio, a galinha, rente
à margem, dormiu.
INVERNO
bicho de pelúcia,
no denso frio da invernada:
criança agasalhada.
PRIMAVERA
brota a primavera,
num bem devagarinho...
-gorjeia passarinho!
ÀQUELE AMOR
hoje relembro com
ardor, toda a inocência
dos bilhetes de amor.
MANHÃ
vendaval imenso,
que revirou, imenso drama:
mexeu toda a cama!
DEPOIS DA CHUVA
passa a lua
no asfalto sob meus pés,
caminho por estas ruas.
FLORES DE ABRIL
finda as flores de abril,
pelas brandas mãos do outono.
-mais uma folha caiu!
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