domingo, 31 de março de 2024

Por meu sangue ainda passam

por meu sangue ainda passam 
os ventos dos mares necrópoles
e o hálito amargo das ondas
brindam mistérios antepassados
sofridos nas vagas de oceanos hostis
ante os olhos das nações

ainda passam por meu sangue
quintais de antepassadas lidas
as brincadeiras 
dos moleques a furtarem frutas
das goiabeiras antigas
a fome nos trópicos

por meu sangue ainda passam
quilombos vencidos pela guerra
vozes de atrozes banzos
marcando com seus brasões as minhas veias
remetendo a dores ainda vivas
sob as cicatrizes

ainda passam por meu sangue
velhas lavadeiras com seus lamentos
e as roupas imundas do passado
rumo aos rios das angústias
quarar as queixas 
vivendo sempre dias iguais

por meu sangue ainda passam
os olhos vítreos das senzalas
acomodando desesperos nas noites intermináveis
curando expostas chagas com sussurros
a liberdade estupefata
com os horrores do cárcere

por meu sangue ainda passam
ainda passam por meu sangue

      Fev. 2021

Um comentário: